terça-feira, março 12, 2013

Ditongos abertos

Muito mais difícil que adaptar-se ao novo é desapegar-se do velho. O novo, ainda que com todas as naturais resistências do estranhamento, chega com o sabor do desafio, do inusitado, da experimentação. O velho demora a desapegar-se. Está impregnado: no cheiro, no olhar, na alma. Há uma lembrança do velho a cada instante, em cada canto. A dificuldade de dissociar-se do velho talvez deva-se ao fato de que ele nunca definitivamente se vá. Fique ali, recluso, adormecido, latente (talvez), inesquecível (certamente). Mas é a partir do velho que constroem-se as histórias de vida; é a partir dele que criam-se as resistências, as fortalezas e alguma (apenas alguma) imunidade. A lembrança do velho é por vezes dilacerante, porque desfia até o que é isento de carne. Mas é igualmente cicatrizante, porque reedifica o espírito. O novo, recebe-se com os braços abertos da razão. Ao velho, agarra-se ferozmente com as garras do coração.

Um comentário:

Claudia Bittencourt disse...

Muito bom, Waguinho! Você conseguiu descrever essa relação entre passado e presente de forma fantástica!

Beijão