sábado, dezembro 09, 2006

Turbulências no céu e na terra...

Adivinhem quem foi uma das vítimas da confusão que se instalou esta semana nos aeroportos de várias cidades do País? Quem sugeriu o nome deste coitado que vos escreve acertou bonito.

Vocês não imaginam o sufoco. Tudo começou quando precisei, de última hora, ir ao Rio para uma reunião a qual eu já havia decidido não ir – especialmente pelo fato de, nesta semana, eu ter apresentado meu trabalho de conclusão de curso da pós-graduação.

Bem, como imprevisto não pede vaga em agenda, tive de me desdobrar, na terça-feira, para dar conta de ir à aula e, em seguida, correr pro aeroporto. Nem imaginei que o caos estava instalado por lá. No caminho do meu trabalho ao Mec, onde buscaria a Vivi, que, por sua vez, me largaria no aeroporto, decidi ligar o rádio do carro para ouvir a CBN, como habitualmente faço.

Aí, comecei a me irritar. Ouvi a inacreditável notícia de que uma pane (ou sabotagem, como se suspeitava no dia) no sistema de comunicações do tráfego aéreo havia interrompido as operações em diversos aeroportos brasileiros. Como desisti de acreditar que vivemos em um país sério, tentei não me horrorizar com o absurdo. Mas não deu para ignorar.

Manifestei minha preocupação a Vivi, mas, mesmo assim, seguimos para nosso destino. Lá chegando, percebi que a situação era 816 vezes pior do que eu imaginava. Nem mesmo em feriadões de fim de ano vi aquele aeroporto tão cheio. E olha que o freqüento com significativa regularidade.

Como a fila para o check-in da Tam ia, mais ou menos, até Belo Horizonte, decidi realizar o procedimento naquelas maravilhosas máquinas salva-vidas que a companhia tem instaladas nos aeroportos e que permitem que passageiros sem bagagens possam se livrar das filas gigantescas.

Tudo feito, recebi a informação de que o vôo sairia, mas com atraso. Liberei, então, a Vivi, e fiquei fazendo hora pelo saguão. Resolvi lanchar. De frente à TV, assistindo ao Jornal Nacional, vejo a informação ao vivo do repórter (rodeado de curiosos ali bem pertinho de mim) de que todos os vôos daquela noite acabavam de ser cancelados.

O termo mais singelo, doce e sublime que ouvi ser pronunciado ao meu redor foi um caprichado “puta que o pariu!”. Fiz a mesma coisa, não tão alto e com outro termo (que não vem ao caso). Corri ao balcão da empresa. As meninas de plástico de trabalham nessas companhias só conseguiam repetir: “É verdade, senhor. O senhor vai ter de estar fazendo a sua remarcação de passagem para amanhã”, me diziam elas num lamentável português, sobrecarregado de irritantes gerundismos.

Bem, o jeito foi entrar na fila e remarcar a passagem – puto da vida, é claro. Afinal, eu decidira viajar na noite anterior para não ter de acordar de madrugada no dia seguinte para seguir viagem, uma vez que a reunião estava marcada para as 9h.

No dia seguinte, a informação inicial era de que o vôo sairia apenas às 8h30. Mentira. Entramos no avião às 8h40 e ficamos lá dentro por mais de uma hora, esperando passageiros que chegavam de um outro vôo para acomodarem-se em nossa aeronave. Quando os coitados chegaram, seguimos viagem. Aí, até que tudo transcorreu tranqüilamente. Quer dizer, nem tão tranqüilamente assim.

Assim que sentei-me no assento 28C, lá no C do avião, um japa com cara de infeliz veio me perguntar: “tem certeza de que seu assento é esse mesmo?”. Como sou educado, resolvi checar e vi que era sim. O mais “divertido” é que era o dele também! Overbook safado! Como eu já estava sentado, e tinha o mesmo direito de seguir naquele vôo como o japa-sofredor, falei para ele procurar os comissários. Daqui a uns segundos veio um engomadinho de um comissário pedindo para ver meu cartão. Com um prazer inenarrável mostrei-o, sem perder a oportunidade de dizer que, se algum engano houvesse havido, não era de minha parte, mas da empresa em que ele trabalha, que empurra mais gente do que deveria numa mesma aeronave.

Mas o problema foi logo contornado. Descolaram um lugar pro japa um pouco mais à frente que o meu. Depois de decolarmos, lamentei não ter ficado no lugar que ele agora ocupara.

Atrás de meu assento – mais no C do avião ainda – um insuportável casalzinho com sotaque goiano ou mineiro (nada contra goianos ou mineiros, apenas contra o bendito casalzinho) falava, aos berros, uma quantidade insuportável de baboseiras. Se isso ainda não fosse o bastante, ainda tinham as filinhas deles: Emily e Evelyn. Não, não estou de sacanagem, eram esses mesmos os nomes das pobrezinhas.

A praguinha da Emily não parava de empurrar meu assento, de gritar e de puxar meu cabelo. Mas eu não esquento. Na verdade, como gosto de criança, logo me virei e fiquei brincando com ela. O problema eram os pais. Os dois bocós depois começaram a discutir porque a outra filha, Evelyn, começou a chorar (ou melhor, a berrar) porque o pai a despertara do sono. A menina, coitada, era muito enjoada. Manhosa e mimada, ficava dizendo que queria dormir sozinha no assento, e não no colo do pai. Este, por sua vez, reclamava com a mulher que a filha era indisciplinada por causa da falta de pulso da mãe, que fazia todas as vontades da criança. Podia até ser verdade, mas, além da provável falta de pulso da mãe, suspeito de uma aparente falta de cérebro do pai, que desfiava um interminável repertório de asneiras das mais variadas ordens.

No dia seguinte, deixei a reunião às 11h40 e fui ao Galeão, já que meu vôo estava marcado para 13h. Para minha surpresa, o aeroporto estava vazio e tranqüilo. Pensei que o inferno estaria na sala de embarque. Mas, não. O bocozinho do check-in disse que meu vôo estava no horário, o que meu deu uma tranqüilidade aumentada pelo fato de que, na sala de embarque, de fato as coisas estavam muito tranqüilas. Estavam... Quando me informei lá dentro sobre o meu vôo, percebi que safado do bocozinho mentira pra mim.

A bosta do vôo estava, sim, atrasado – e muito. Programado para sair às 13h, o avião, segundo uma outra menina de plástico, estava parado em Brasília, só devendo chegar ao Rio às 14h50, ou seja, com quase duas horas de atraso. A minha preocupação era maior porque eu havia me comprometido de estar em Brasília às 15h para comparecer à aula da pós.

Durante a espera, fiz a besteira de perguntar para um cidadão ao meu lado se o vôo dele era o mesmo que o meu, já que ele também se mostrava puto pelos atrasos. Besteira porque o cara era um verdadeiro mala. Bastou uma simples pergunta, que poderia ser perfeitamente respondida com um breve “sim” ou “não”, para que o infeliz começasse a puxar papo. Nada contra conversar com estranhos. O problema é quando esse estranho é mais estranho do que você suporta.

O cara começou dizendo que estava cansado porque voltava de uma viagem internacional. Chagava da Alemanha, para ser mais preciso. Até aí, nada de tão ruim, afinal, até que é normal um ser humano querer gabar-se de uma temporada no exterior. O problema é que o Mister Mala perguntou se eu também já havia feito uma longa viagem internacional. Apenas respondi que sim, sem entrar em maiores detalhes para não parecer esnobe como ele.

Mas a criatura não sossegou. Aproveitou a deixa para narrar todas as suas aventuras internacionais e, mais precisamente, a sua surpreendente habilidade com línguas estrangeiras. Sem o menor vestígio de modéstia (e, principalmente, sem eu nada haver perguntado sobre o assunto), o desmiolado teve a petulância de dizer que fala perfeitamente o alemão. “hã-hã, legal”, respondi, deixando claro que, além de não ver nada de fantástico com aquilo, também não querer mais prolongar a conversa.

Mas não teve jeito. Ele continuou. Disse que, agora, só falta dominar o inglês, porque todas as outras línguas “fundamentais” (destaque dele), ele já dominava. “Falo perfeito francês, italiano, espanhol”. Isso mesmo, sequer o tan-tan usou a palavra “fluentemente”, ou se preocupou trocar o adjetivo pelo advérbio requerido na frase. Optou pelo perfeito, se achando a confirmação da existência divina. Em relação ao inglês, ele voltou a dizer que seu objetivo, a partir de agora, era dominar 100% da língua de Shakespeare, mas que, no momento, ele só a domina em “90%”. Sinceramente, poucas vezes ouvi uma merda tão grande sobre esse assunto. Fiquei me perguntando o que diabos seria dominar 90% de uma língua.

Será que, de cada frase composta por 10 palavras em inglês, o infeliz acerta nove? Ou será que ele só ainda não domina o present perfect? Huumm, meio improvável essa segunda hipótese, pois certamente representa uma porcentagem muito maior. Mas, enfim, nem ousei perguntar. Tratei de ligar meu computador e preparar a apresentação de meu trabalho para fugir do foco do Bag Man. Graças ao santo Santos Dummont que o avião que levaria aquela besta-fera chegara. Despedi-me educadamente desejando-lhe boa viagem (e, sinceramente, nunca mais reencontra-lo...)

Tempos depois, chega minha hora de embarcar. Aliviado e ansioso, fiquei muito irritado quando percebi que estávamos parados na pista do aeroporto, aguardando uma porra de uma autorização que não chegava nunca. Meia hora depois ela chegou. Decolamos e eu fazia as contas para saber quanto da aula eu ainda conseguiria assistir. Como decoláramos às 15h30, imaginei que pousaríamos em solo candango às 17h.

O avião chacoalhava muito devido ao mau tempo. E foi exatamente esse mau tempo que me trouxe mais um motivo de irritação. O piloto anunciara que, devido às péssimas condições climáticas em Brasília, não poderíamos aterrissar. “Caralho, hoje é meu dia!”, protestei individualmente. O pior é que o piloto nos enganou. Disse que passaríamos 20 minutos esperando para pousar. Mas, na verdade, passamos uma hora. Sim, 60 minutos dando voltas no céu de Brasília. Quando eu já nem acreditava mais que desceria daquele avião, enfim, pousamos. Olhei pro relógio: 17h50! Impossível chegar à aula em tempo, já que a mesma terminaria às 18h. Liguei para uma colega da turma, que confirmou que, especialmente naquele dia, a aula terminara mais cedo.

Liguei pra Vivi e refizemos os planos, que eram, antes, de ela me pegar na aula e novamente, seguirmos para o aeroporto, de onde, desta vez, ela seguiria em viagem. Na reformulação de nossos planos avisei que ficaria guardando o lugar dela na fila da Gol, que estava bem pertinho de Vitória, no Espírito Santo.

Encontramo-nos, beijamo-nos e fomos lanchar. O aeroporto continuava insuportavelmente cheio. Mas, ela deu mais sorte que eu. Apesar do atraso, seu vôo saiu. E eu também saí... correndo daquele inferno.

Um comentário:

Ana Laura disse...

Nossa, Wagner, tô exausta só de ler esse texto!
Estou repensando meus planos de viagem com a Helena só por causa desses "detalhes"...