quarta-feira, janeiro 12, 2005

A violência nossa de cada dia (parte 3)

Conforme prometido, prossigo hoje com o “fórum” sobre violência e algumas das prováveis causas de sua existência e ampliação. Atendendo ao pedido da Lalá, o tema de hoje é a descriminalização do uso e do comércio de drogas. Vou direto ao ponto: se sou favorável a esta medida? Sim! Se sou favorável a que esta medida seja implantada no Brasil imediatamente? Não sei! É, realmente não sei. Sou favorável à descriminalização do uso de drogas por uma razão bastante simples: cada um faz o que quer de sua própria vida — desde que, claro, não importune os outros.
Mas é preciso reconhecer que a questão não é tão simples assim. As drogas (incluindo aí o cigarro e a bebida) são uma droga. Fazem desmoronar milhares de vidas, subvertem famílias, ceifam esperanças e colaboram com a desestruturação dos sistemas públicos de saúde. Portanto, não basta tornar o seu uso e comercialização legais para acabar com o narcotráfico e, conseqüentemente, reduzir a violência.
Vamos com calma, por favor. O exemplo da Holanda, onde pode-se consumir drogas com a permissão da lei, não deve ser simplesmente transposto para a realidade brasileira. É fundamental entender que os dois países têm diferenças abissais, sejam elas sócio-econômicas, sejam elas culturais. Portanto, precisamos, primeiro, discutir a questão. Mas é como disse a Lalá: há um manto de hipocrisia encobrindo o assunto aqui no Brasil. Sequer discutimos a coisa. Fazemos de conta que nada acontece, viramos o rosto pro outro lado e o circo que pegue fogo longe de nossas casas.
Não, não podemos mais ficar nesse estágio. Como eu disse no primeiro post sobre o assunto, temos de sair da inércia. As drogas, sua existência, circulação e consumo são, ao mesmo tempo, de interesse direto de segurança pública e de saúde.
Avaliemos a nossa situação atual sobre o tema. No Brasil, as drogas são proibidas. Ok. Fumar um baseado-paz-e-amor dentro do recinto do próprio lar, seja para relaxar das tensões do dia-a-dia, seja para “viajar” e ver Buda de perto, impõe ao “maconheiro” a ameaça de ir parar atrás das grades. Isso é INjusto? Não tenho dúvidas que sim. Cadeia tem de ser pra Bandido — com B maiúsculo mesmo: traficante, seqüestrador, latrocida, estuprador, Paulo Maluf e espécies do gênero. Gente que ameace de fato o perfeito equilíbrio de uma sociedade qualquer.
E não defendo isso para legislar em causa própria. Pelo contrário. Não me orgulho nem me envergonho do que vou dizer agora, mas jamais usei qualquer tipo de droga “ilícita”. Pelo menos não ativamente, já que, passivamente, já freqüentei vários lugares onde a fumaça da erva danada quase me levou ao Nirvana. Sou “invicto” não por receios ou preconceitos, mas por absoluta falta de curiosidade. Só isso. O dia em que ela pintar — e há sinais de que está pintando — “acederei uma tocha” numa boa. E todos vocês saberão (só peço que não me denunciem — rs).
Mas tenho de confessar que essa curiosidade foi reprimida por uma convicção que desenvolvi desde adolescente sei lá por que razões. Sempre pensei com meus botões que, indiretamente, ao queimar um baseado ou tomar um ácido qualquer, a pessoa está contribuindo para a sustentação do tráfico. Com isso, alimenta a violência.
Não deixa de ser infantil, mas também não deixa de ser verdade. Eis o problema. Nosso desafio é dissociar as duas coisas. É certo que a descriminalização do uso e comercialização das drogas (obviamente obedecendo a determinados critérios de saúde pública) traria problemas. Afinal, é uma mudança e tanto. Mas deixar o barco correr como vem acontecendo, pelo que estamos vendo, não está surtindo efeito positivo algum. Posso estar errado, mas vejo na descriminalização do uso e do comércio de drogas a única chance de acabar com o atual e inabalável poder dos traficantes. A famosa Lei Seca, que vigorou nos EUA na década de 20, serviu apenas para mitificar foras-da-lei, como Al Capone. Ao que tudo indica, os “manos” do morro chegarão ao mesmo patamar.

2 comentários:

Anônimo disse...

Wagner, eu acho que com a regulamentação da venda e uso de drogas, a guerra sairia do morro e entraria nos escritórios das grandes corporações. Essa briga de cachorro grande talvez seria mais limpa, não expondo a sociedade à violência diária vista hoje no Rio de Janeiro e São Paulo. E poderíamos ver, afinal, quem são os grandes donos do negócio, pois sabemos que não é o chefe do morro que conhecemos, não é mesmo? Quem financia? No início disso tudo haveria um movimento organizado contrário da Igreja e da família, com medo de que todos, inclusive as donas-de-casa, quisessem provar um baseado ou ecstasy como se estivessem numa confeitaria... Depois de uns anos, entraríamos numa nova "normalidade". Seria legal ver alguns vovôs tomando café e puxando um fumo na calçada de um bar...
Ana Laura

Wagner Vasconcelos disse...

Assino embaixo do que vc diz, Lalá. E digo mais: essa descriminalização só não avança porque os verdadeiros "donos" do negócio movimentam todos os pauzinhos possíveis e imagináveis para permanecerem nas sombras, lucrando com o esfarelamento de vidas alheias.