domingo, novembro 28, 2010

Tempos e verbos

O passado lhe havia sido perfeito na medida exata de sua imperfeição. Mas por que insistia, então, em conjugar aquilo pertencente a outros tempos sempre no presente do indicativo? Não sabia, como sempre fazia questão de ressaltar, que o presente não existe? 

Repetia, a quem quer que fosse, que o presente se desfaz no exato instante em que dele se toma consciência. Pensar no presente é remetê-lo instantaneamente a sua condição de passado. Qualquer fração de segundo que se aplique a reflexões sobre o pretenso presente invariavelmente recai na constatação de sua inexistência. Qualquer palavra pronunciada, qualquer pensamento formulado, qualquer onda que se esgota na areia da praia e qualquer vento soprado, desde o instante que surge, já é coisa do passado. Mesmo o seu desenrolar não pertence ao presente, pois é uma seqüência de micro-atos lançados ao passado no mesmo momento em que ocorrem. Nada escapa ao passado, embora muito escape ao futuro – este, sim, um tempo existente, embora transitório. O passado, ao contrário, é sólido, inalterável.

Não há tempo (verbal ou cronológico) mais injustiçado que o presente. Sua existência é uma mera abstração, ou, quando muito, uma convenção matemática ou lingüística – sob o ponto de vista dele, absolutamente dissociada da realidade. Observou que usufruir bem do presente é dar robustez ao passado. O futuro, portanto, há de ser acalentado, pois nada mais é (ou será) do que o passado que se espera ter.

Um comentário:

Celso Cavalcanti disse...

Muito bom o texto. Parabéns pelo blog. Fica o convite para visitar o meu: olhodeprosa.blogspot.com.